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22 maio, 2010

A ira


Ontem enquanto defecava pensei : de uns tempos para cá o que era suspeita transformou-se em certeza inconteste. O título de doutor, para muitos, apenas potencializa a incapacidade de reflexão, tamanho o marasmo intelectual em que se meteram na sua submissão ao tirocínio ideológico da sociedade mercantil. Palestras e mais palestras em universidades públicas desenham um bizarro quadro: doutores "mercadoria" instruídos alimentam o sonho de conquista de inocentes "mercadorias" ignorantes. Em tais encontros mantras e mantras de subserviência são proferidos até se atingir um transe coletivo que dissolve qualquer resíduo de autonomia espiritual. Todos, palestrantes e audiência, reverenciam zumbificados a constelação valorativa imposta pelo capital. Em nenhum momento se pronunciam sobre os efeitos da submissão dos autênticos valores humanos ao "valor de troca". Reificação, destruição dos biomas, competição "animalesca", mercantilização dos afetos, atrofia subjetiva, hedonismo como "prótese" de sentido, indiferença a alteridade humana ou natural, egoísmo como fonte motivadora das ações, prostituição da dignidade trocada por dinheiro, aparência como modo de existir, etc. Tudo isto nem sequer é cogitado, pois no horizonte futuro da audiência se anuncia a presença magnetizante dos bens de consumo a serem conquistados como resultado de uma carreira bem sucedida e vitoriosa. Por outro lado, no horizonte presente do palestrante este manifesta o já conquistado como recompensa a subserviência ao senhor dinheiro. Mais do que isto, uma vida confiscada pelos pueris valores dos dominantes é tomada como exemplo de plenitude existencial. A busca da "liderança" e do poder se apresentam como "meta" e "foco" de quem é espesinhado pelo poder e encontra na ascenção social a possibilidade de fazer o mesmo, consciente disto ou não. É como se o ressentimento em relação a condição social de origem transformasse o "vencedor" em sádico que ostentando poder pode agora degradar o não poderoso, a não ser que este se esforce e se torne também "proeminente". Se o sujeito já nasce rico e poderoso, então é pior ainda pois seu sadismo lhe parece natural e não "conquistado". Também o suposto orgulho pela origem simples dos que "venceram" se reduz a uma nostalgia hipócrita do tempo em que ele não era "ninguém". É esta "lógica" psico-social irracional e subterrânea que preside os discursos nas academias e penetra os ouvidos incautos de quem já se encontra encarcerado no deserto da aridez reflexiva que é o mundo mercantil. Este é o próprio "mal absoluto" corporificado para quem possui o mínimo de sentimento de indignação com uma ordem que sacrifica o que há de mais humano na maioria da humanidade para que uma fração da humanidade continue se desumanizando ao negar-se na opção pela mercadoria e pelo dinheiro. Em nossos tempos a perversidade penetra cada poro da existência social e os doutores, com conhecimento de causa ou não, camuflam ou dissimulam o "terrível" adornando-o com promessas de realização privada. E assim caminhamos para o melancólico fim, não sei se digo "graças a deus" pois desse modo podemos recomeçar, ou se digo "evitemos" senão não haverá mais começo, de qualquer modo o tempo presente é o que me interessa e neste não vejo seres humanos, mas apenas fantasmas, uns falando e outros ouvindo.


Por Mano, um bailarino.

2 comentários:

Bárbara disse...

Paulo Freire já dizia que o oprimido introjeta o opressor e assim o ciclo continua....
Adorei, també fico engasgada com isso!!!!

Bárbara disse...

Carmentereza sou eu a Babita :)